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A história dos povos indígenas e sua dimensão social: entrevista com Lana C. Gomes de Araújo

Atualizado: 4 de jun. de 2020


"Parece que o objetivo desse dia [19 de abril], nada mais é do que fantasiar as crianças não-indígenas, tomando como referência uma vestimenta que sequer representa os indígenas do nosso país, se assemelhando muito mais aos trajes utilizados pelos apaches americanos, como aqueles que assistíamos no desenho do Pica-Pau. Isso não pode ser mais aceitável".

Éverton Aragão entrevista Lana C. Gomes de Araújo


Para quem acompanha o Máquina dos Tempos sabe que temos inúmeros projetos - bem sabe, também, que muitos deles ainda não estão em plena execução. Nesse meio tempo em que o site veio ao ar pela primeira vez, cerca de 2 anos, nos inventamos e reinventamos. Muitas ideias surgiram e outras foram esquecidas.


Buscando expandir nossas ideias, na esperança de poder influenciar ainda mais as pessoas a aprenderem e conhecerem sobre história, criamos espaços, propostas e categorias: uma delas é a sessão de Entrevistas. A ideia é criar um canal alternativo para conhecermos um pouco daquilo que acadêmicos de História e professores da área vêm produzindo, criando e inovando. Consideramos, também, que intimizar e colocar um sujeito atrás dessas histórias é fundamental. Por isso, além de perguntas teóricas e pontuais, pretendemos também conhecer um pouco sobre a vida e trajetória desses sujeitos.


Enfim, fazer um conteúdo de qualidade não é tarefa fácil. Fomentar certas discussões significa sair de uma zona de conforto e questionar, e refletir. Aproveito isso para agradecer as pessoas que fazem o projeto Máquina dos Tempos caminhar além do ponta pé inicial.


Não poderia deixar de agradecer também a Lana C. Gomes, nossa primeira entrevistada - um marco que se abre para a história desse pequeno (bem pequeno) portal de divulgação científica de História. E não teria como iniciar de outra forma: uma semana atrás, no dia 19 de abril, atravessamos como de costume anual a data do "Dia do Índio". Hoje, uma das exímias pesquisadoras que tive oportunidade de conhecer no grupo de pesquisa Nordeste Colonial e Imperial (CNPq), vem conversar um pouco sobre algumas questões que atravessam os povos indígenas e nos últimos anos estão ganhando destaques.

 
Lana C. Gomes, Fonte: acervo pessoal da entrevistada.

Poderia nos falar sobre suas origens, familiares e culturais?


Sou de uma família pequena, muito unida e de pessoas simples. Poucos tiveram a chance de ter uma educação escolar completa e, apenas meu pai frequentou o ensino superior. Com muita dificuldade, meu pai e minha mãe fizeram de tudo para que eu tivesse a oportunidade de estudar em escolas melhores. Para isso, tinham que passar horas durante a madrugada em uma fila no colégio das Damas, uma escola tradicional da nossa cidade, na tentativa de pegar uma ficha para solicitarem, por meio de uma entrevista, uma bolsa de estudos para mim. A bolsa de estudos, só poderia ser renovada no ano seguinte se eu tirasse boas notas e tivesse um bom comportamento na escola. E, nós conseguimos, e assim fui bolsista até o terceiro ano do ensino médio. Lembro que na época meus pais foram criticados, pois, “como podia e para que uma filha de pobre iria estudar em uma escola particular?”


Onde você fez seus estudos? Por que história?

Na escola em que estudei, quando se aproximavam as inscrições para a prova do vestibular, nós tínhamos uma conversa com a equipe pedagógica e psicólogos para que esses profissionais nos ajudassem a escolher o curso de graduação. Eu já sabia o que queria: Direito. Mas, em nossa conversa, vimos que o curso de História podia ser uma opção interessante, devido ao meu desempenho nas disciplinas de História, Sociologia e Ciências Sociais. Decidi tentar a aprovação nos dois e deu certo. Para o primeiro semestre, fui aprovada em História (UFCG) e para o segundo, em Direito (Unifacisa). Fiquei sem saber qual deles escolher e resolvi cursar os dois, pois sentia que um complementava o outro e, assim, me formei nos dois. Direito me proporcionou conhecimentos que, hoje, utilizo enquanto historiadora e cidadã. História me despertou pelos debates, pelas problematizações, pelas incansáveis discussões e desconstruções sobre tudo e qualquer coisa. Me ensinou a relativizar e repensar os processos históricos, questionando e respeitando os protagonismos dos diversos agentes da história, suas trajetórias e memórias.


Como se desenvolveu inicialmente sua relação com a etno-história indígena?


É uma longa história, mas vou tentar resumir. No primeiro ano cursando História, participei de um Projeto de Extensão sobre Educação Ambiental, orientado pela professora Silvana Ribeiro, quando fui convidada para ser monitora de uma disciplina ofertada por ela no PROLIND (Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais Indígenas), resultado de um projeto entre os Potiguara e a Universidade Federal de Campina Grande.


No primeiro encontro, uma sala de aula marcada pela presença do povo Potiguara me fez desconstruir vários estereótipos que aprendi nos livros didáticos sobre os indígenas do nosso país. Ali, homens e mulheres indígenas mostravam a sua etnicidade, suas diferentes formas de saber e uma história marcada por luta, exclusão e violação de direitos. O que despertou em mim inúmeros questionamentos e vontade de escutar, através deles, as suas versões sobre suas próprias histórias e memórias. Um ano depois, as disciplinas de História do Brasil e Brasil Colônia me apresentaram a Profa. Dra. Juciene Ricarte Apolinário, e, a partir daí, desenvolvemos três projetos de Iniciação Científica. Participei de um projeto nacional financiado pela Petrobrás Cultural na elaboração de dois catálogos de documentos manuscritos sobre História Indígena e Escravidão Negra no Brasil Colonial; organizamos eventos nacionais e internacionais; e, sob sua orientação, continuei a pesquisar sobre temas relacionados a história indígena durante o mestrado. No curso de Direito, a Profa. Celênia Macedo me levou pela primeira vez ao território indígena Potiguara, onde passamos a pesquisar sobre legislação indigenista, em especial sobre a Educação Escolar Indígena, quando passei a acompanhar de perto as reivindicações desse povo.

 

Por muitos anos, o "índio" apareceu em trabalhos de História apenas como uma peça no sistema colonial, alguém que, ora se sujeitava a uma força muito maior que ele, ora se isentava dos acontecimentos políticos e sociais no meio das matas. Hoje, no entanto, entende-se que a realidade era diferente. Os povos indígenas faziam parte de uma rede ampla, com algum espaço para negociar. Mas, o que exatamente isso quer dizer? O indígena deve ser compreendido para além do “selvagem”?


Infelizmente, por muito tempo a historiografia se reportou aos indígenas como “seres em processo de desaparecimento” e em “processo de transição”, pois acreditava-se que seriam integrados pela sociedade circundante. Até a década de 80, por exemplo, era possível nos depararmos com trabalhos que afirmavam que “os indígenas não tinham história, apenas etnologia”, apresentando-os como sendo um dos “grandes embargos a evolução do Brasil”. A escrita da história sobre os povos indígenas ainda apresenta muitas lacunas. Somente em meados da década de 80 intensificaram-se os estudos sobre a temática indígena, partindo de um conjunto de pesquisadores desconfortáveis e indignados em relação à forma superficial e preconceituosa com que era abordada a existência dos indígenas. Mais recentemente, com o auxílio de métodos de pesquisa de outras disciplinas, como da Antropologia, Arquivologia, Diplomática etc., e da influência da História Cultural, tem-se novas possibilidades de temas, metodologias e fontes documentais que nos têm permitido verificar os protagonismos e agenciamentos indígenas no cenário colonial. Homens e mulheres que sabiam se colocar diante os agentes coloniais e agir conforme interesses próprios.


O dia 19 de Abril – “Dia do Índio” – é um convite ao reconhecimento da existência dos povos indígenas e à valorização das suas manifestações culturais. Mas, ainda há um intenso debate entre lideranças indígenas, ativistas, estudiosos e sociedade sobre o real intuito da data. Como você enxerga os potenciais e as limitações desse dia?


O dia 19 de abril é uma referência ao dia em que foi realizado o primeiro Congresso Indigenista Interamericano, no México, em 1940. Há algum tempo, as comemorações do dia do Índio, pelos não indígenas, acontecem, em sua maioria, nas escolas de ensino infantil e fundamental de todo o país. Na ocasião, os professores continuam a fantasiar os alunos com uma pena colorida sobre a cabeça e uma pintura com um ou dois traços nas bochechas deles - assim como fizeram comigo quando era criança. Parece que o objetivo desse dia nada mais é do que fantasiar as crianças não-indígenas, tomando como referência uma vestimenta que sequer representa os indígenas do nosso país, se assemelhando muito mais aos trajes utilizados pelos apaches americanos, como aqueles que assistíamos no desenho do Pica-Pau. Isso não pode ser mais aceitável. Pouco ou nada se problematiza com as crianças sobre esse dia. Quando se fala do “índio”, geralmente faz referência ao “índio” morto, ao “índio” do passado, e que no passado mesmo ficou. Ou seja, esse dia continua a tentar resumir os indígenas a um cocar, a caça, pesca... Por isso, nós não podemos mais investigar o passado pelo passado, exclusivamente nos pautando em uma postura historicista. Não podemos lembrar dos indígenas apenas no dia 19 de abril, ele simboliza mais um dia de resistência indígena na luta contra várias mazelas sociais, violências que envolvem os interesses econômicos dos posseiros, grileiros, madeireiros, invasão aos territórios indígenas etc. Mais recentemente, durante o mês de abril, lideranças indígenas e pesquisadores têm utilizado suas redes sociais para promoverem debates interessantes e conseguirem um pouco mais de visibilidade no cenário nacional. O uso das redes sociais através de blogs, páginas no Facebook, perfis no Instagram, a utilização de hashtags, compartilhamento das postagens, canais do Youtube promovidos pelos próprios indígenas têm divulgado positivamente a causa e ajudado a conscientizar a população, principalmente entre os mais jovens. É um mês que marca as lutas sociais do movimento indígena que pede o reconhecimento de seus direitos, o fim do genocídio, a demarcação e o reconhecimento do direito à terra, por exemplo.


A história dos povos indígenas é frequentemente marcada por sangue e tragédias. Você reconhece uma violência estrutural ainda por eles sofrida? Qual delas você poderia pontuar como a mais preocupante?


Sem dúvidas. A violência estrutural nos auxilia a discutir a relação do presente com o passado, problematizando acerca das situações históricas que marcaram as desigualdades em múltiplos níveis desdobrados em sofrimento, marginalização, silenciamento e exclusão, tanto de indivíduos quanto de comunidades. Para tanto, acredito que precisamos, antes de mais nada, romper com os regimes de memória, como elenca o professor João Pacheco, que nada mais são do que práticas discursivas que foram criadas para os indígenas, configurando em imagens preconcebidas que os definiram e os limitaram de maneira negativa. Resumidamente, os regimes de memória são: 1) a ideia que relaciona as nações indígenas com o nomadismo; 2) a rigorosa separação entre índio colonial que estava no cenário missionário religioso que trabalha em pequenas agriculturas e índio bravo que estava nas incursões militares/guerras justas; 3) o índio “do passado” visto nos personagens da literatura indianista e das artes românticas e o índio “real” que perdeu sua cultura e vive em condição de miséria; e 4) baseados pela memória de movimentos e organizações indígenas na contemporaneidade, busca expor o índio com grande exuberância e beleza. Acredito que a maioria da violência sofrida por esse povo está relacionada aos regimes de memória divulgados pela historiografia dita oficial, pela literatura romântica, pelos institutos históricos... tudo isso associado ao conceito de cultura equivocadamente propagado socialmente que em uma espécie de proibição, veta o indígena de usar roupa, senão de penas. De se alimentar senão de produtos plantados ou caçados por ele. De locomover-se senão a pé ou de canoa. Tudo isso sob a alegação que “deixou se ser índio”. Esse é o maior problema. As pessoas acham que se tiver celular, que se andar de carro deixa de ser “índio”. Isso não tem nada a ver. Se as pessoas entendessem que a cultura é um processo mutável e fruto de interação entre os grupos étnicos de diferentes tipos organizacionais e resultados da interação entre atores sociais diversos que mantêm fronteiras simbólicas diferenciadoras, portanto, fronteiras interétnicas, poderiam compreender que “ser índio”, ser indígena, ultrapassa todas essas questões acima citadas.


Mesmo após as políticas de isolamento e distanciamento social, o balanço mais recente da Secretaria Especial da Saúde Indígena (SESAI) relaciona um total de 23 casos confirmados de COVID-19 entre a população indígena e outros 25 estão aguardando confirmação. Você observa, nesse tipo de acontecimento, a vulnerabilidade dos povos indígenas e a falta de políticas direcionadas para eles?


Cada grupo étnico tem enfrentado a pandemia de acordo com suas especificidades. Um dos problemas que pode ser destacado é a dificuldade financeira dos que fazem e vendem arte indígena, por não poderem sair das aldeias e não terem para quem vender suas artes no momento. Em uma transmissão ao vivo no Instagram, no dia 24/04/2020, Sonia Guajajara e a Takan Watatakalu discutiram, a partir de suas experiências, enquanto lideranças, o cenário internacional de pandemia por causa do COVID-19. Para Sonia, a frágil estrutura e a ausência de investimentos na saúde já faz parte do cotidiano dos Guajajara e se torna pior nas notícias de confirmação da contaminação, e dos 12 óbitos de indígenas (juntando Manaus, Pará e Roraima), pois não há testes rápidos, nem lugar para internação dentro dos T.I. Segundo elas, os cuidados no T.I devem ser os mesmos direcionados para os não indígenas: não sair de casa, evitar aglomerações e usar máscaras, por exemplo. Porém, alertam para o fato de que nem sempre é fácil falar sobre links, sites e transmitir informações pela internet, tendo em vista que muitos parentes indígenas não têm acesso a esse tipo de comunicação. Portanto, uma preocupação atual é a compra de equipamentos de radiofonia, especialmente para os povos isolados, para que se possa atualizá-los, transmitir notícias e enviarem notificações de contaminações, além de servir de instrumento para que esses povos denunciem a invasão de pessoas que estão se aproveitando da situação para adentrar nos T.I, como é o caso dos de madeireiros e garimpeiros.


Nos últimos anos tivemos algumas experimentações práticas da LEI Nº 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008. Você observa avanços na Educação Básica com relação ao tema? Caso sim em que sentido? Se não, por que?


Com a lei nº11.645/2008 foi estabelecido a obrigatoriedade da inclusão e as diretrizes para educação nacional da temática “História cultural afro-brasileira e indígena” no Brasil. Em passos bem lentos, tem-se conseguido algumas mudanças, mas que ainda não são suficientes. Estas pequenas mudanças só foram possíveis com as reivindicações do movimento indígena associadas às discussões dos etnohistoriadores, antropólogos, e outros pesquisadores nos meios acadêmicos que se afastaram das visões eurocêntricas e passaram a valorizar as experiências múltiplas dos povos indígenas tanto no passado quanto no presente. No ensino escolar, nos deparamos com um livro didático que ainda insiste em tratar a história indígena no passado, especialmente no período colonial, na parte do “Descobrimento do Brasil” (outro termo que precisamos discutir em sala de aula, pois não se tratou de um descobrimento). Nesse capítulo do livro, geralmente são utilizados termos como: espelhos, miçangas, ingênuos, extermínio... e outros, que refletem a visão dos portugueses diante aquela situação. Quando na verdade, esse contato tinha outro sentido completamente diferente para os indígenas, o que não é discutido. Poucos livros vêm se adaptando a essas problemáticas, tem sido passos bem lentos. Precisamos mostrar aos alunos que os indígenas estão espalhados por todo o território brasileiro nos dias atuais, lutando, resistindo, ressignificando e resgatando suas histórias após séculos de exploração... E mais, podemos abordar a temática indígena em qualquer disciplina, e não apenas História. Em português, as questões linguísticas, os troncos linguísticos, por exemplo. Na literatura, poemas, contos e histórias indígenas. Em Geografia, questão de patrimônio material e imaterial, território indígena... Em biologia, os saberes indígenas, as práticas curativas... Em artes, as pinturas, a arte indígena, o artesanato, o trançado... Em educação física, as danças, os rituais, os esportes, as brincadeiras, tomando como referência os Jogos Indígenas que acontecem anualmente em várias etnias. Ou seja, há uma infinidade de temas e formas de trabalharmos a temática indígena na escola, mas que ainda não faz parte da realidade nas nossas escolas não-indígenas.


Recentemente você foi aprovada no Doutorado em História da UFPE, deixo aqui nossos parabéns registrados, mas, quais são seus planos de pesquisa para o futuro?

Muito obrigada. No Doutorado, sob a orientação do professor George Cabral, meu objetivo é tratar sobre as relações existentes dos governadores da Capitania da Paraíba na primeira metade do século XVIII, com os diversos atores sociais que estavam inseridos no contexto da capitania. Como protagonistas, pretendo dar visibilidade aos administradores régios locais, os religiosos, negociantes, comerciantes, mas principalmente aos povos indígenas e aos africanos trazidos forçadamente. Para tanto, me apoio nas concepções historiográficas de que havia uma lógica bastante complexa na América Portuguesa e uma administração colonial que não era centralizada nem unilateral, existindo uma dinâmica interna própria em cada capitania, evidenciada nas relações sociais entre os diferentes grupos que aqui viviam.

 

Lana C. Gomes de Araújo é Doutoranda em História, Linha Mundo Atlântico, pela Universidade Federal de Pernambuco. É Mestre em História pela Universidade Federal de Campina Grande, pela linha de pesquisa Poder, Cultura e Identidades. Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FACISA). Licenciada em História pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). É pesquisadora do Grupo de Pesquisa de Nordeste Colonial e Imperial (CNPq) e integrante do Grupo de Pesquisa Turismo no Espaço Rural: Planejamento e Gestão - GPTER. Realiza pesquisas sobre a América Portuguesa, especialmente sobre a administração colonial e as relações políticas envolvendo os diversos agentes coloniais deste lado do Atlântico, como: governadores, capitães-mores, religiosos, indígenas e negros, a partir de suas trajetórias, redes e conexões, agenciamentos, etc. Atuou no Edital da Petrobrás-Cultural, juntamente com outros pesquisadores na elaboração de dois catálogos de documentos avulsos manuscritos, digitalizados e microfilmados referentes à História Indígena e Escravidão Negra no Brasil.

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