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Análise do LIVRO I de A CIDADE DE DEUS - Santo Agostinho

Atualizado: 9 de mai. de 2020

*Este texto se trata de uma autoria conjunta entre Karol Miranda Éverton Aragão*

Meu Deus está presente em toda parte, todo inteiro em toda parte. Ele, cuja presença é secreta e cuja ausência independe de movimento, não conhece limite. Quando me aguilhoa com ferrão da adversidade, é que me põe a virtude à prova ou me castiga as ofensas e, porque sofro piedosamente esses males temporais, me destina recompensa eterna. - Santo Agostinho, Livro I, A cidade de Deus.

1. Vida e obra: O bispo de Hipona


Aurelius Augustinus (ou, Santo Agostinho) nasceu no ano de 354 d.C. em Tagasti, localizada ao norte da África, Numídia, atual Argélia. Na infância e na adolescência teve duas influências: a influência passiva do pai, Patrício - que não era cristão -, que era fazendeiro e possuía um cargo no governo romano; e a influência de sua mãe, Mônica, que, de maneira contrária, conheceu os ensinamentos bíblicos e era uma cristã assídua. Dessa maneira, podemos dizer que Santo Agostinho cresceu sob a perspectiva do paganismo do pai e dos preceitos religiosos defendidos pela mãe.


Agostinho, porém, adotou uma vida devassa, emanando de si esbanjamentos. Por mais que Mônica lhe instruísse a conhecer a bíblia, só se converteu ao cristianismo com 33 anos de idade. Estudou retórica em Cartago, onde aos 17 anos passou a viver com uma mulher, da qual teve um filho, Adeodato – falecido na adolescência. Nesse mesmo período, interessou-se por filosofia ao ler Hortensius, de Cícero, e foi quando também aderiu ao Maniqueísmo.

Com claros conhecimentos na área de retórica, passou a lecionar e radicar-se entre Roma, Cartago e Milão. Foi nesta última cidade que ele recebeu ensinamentos de Santo Ambrósio, bispo de Milão. A partir de então, seduziu-se pelo cristianismo, voltou-se para o estudo dos filósofos neoplatônicos, renunciou aos prazeres físicos, converteu-se definitivamente ao cristianismo (387 d.C.), e foi batizado pelo próprio Ambrósio, junto com o filho Adeodato.

Logo após a sua conversão, retirou-se do magistério, dedicando-se mais intensamente à filosofia neoplatônica. Regressou ao continente africano e foi a contragosto ordenado padre pouco tempo depois – iniciando a contagem aos 36 anos, ele passa de vigário à bispo (de Hipona) no período de 5 anos. No campo filosófico, teceu duras críticas a pensamentos como o Maniqueísmo (antes defendido por ele). Pouco antes da invasão da África pelos vândalos, Agostinho morreu. Na data fixada no dia 23 de Agosto de 430, a história se despede do homem que concebeu um Deus perfeito, eterno e intocável, interpretação essa que pautou o cristianismo daí em diante.

Ainda que todos o ouvissem com admiração, sua pessoa foi capaz de deixar para a posteridade uma coleção de obras de imenso número e de majestosa qualidade. Sem explicitar um sistema filosófico perfeitamente acabado, sua obra se ressentiu pela falta de preparo em língua grega, a qual lia apenas em traduções. Mas seus escritos, como já foi dito, são de extraordinária riqueza, além disso, anteciparam um valor racional à fé cristã e que posteriormente fomentaram pensamentos como o de Tomás de Aquino, Lutero, Calvino etc.

Suas obras são reeditadas até hoje. Dentre elas, as de maior prestígio são: Confissões (400) - de cunho autobiográfico, é uma de suas obras mais intensas, a qual relata sua vida antes da conversão - e A cidade de Deus (413-426) - um intenso e apologético trabalho dedicado ao cristianismo e a uma visão racional do Reino de Deus. Ambas se tratam de obras que foram fruto de um coração que queria conhecer a Deus.



2. Seu estilo de escrita e as apropriações que constroem seu discurso


Por mais que o texto acessado por nós se trate de uma tradução para o português, podemos constatar, por meio da leitura do Livro I de A cidade de Deus, que a obra de Santo Agostinho se caracteriza por ser bastante erudita. Além disso, por ter vivido boa parte de sua vida como um típico cidadão romano, vindo somente depois a se converter ao cristianismo, essa dualidade entre Roma versus cristianismo também é notável no campo teórico de seu discurso.

Se por um lado Santo Agostinho se utiliza dos escritos do filósofo grego Platão, se apropriando e ressignificando principalmente o seu conceito de dualidade, por outro, o autor também se utiliza do livro sagrado dos cristãos, a Bíblia, para a construção de seu texto. Para mais, notamos o amplo conhecimento que o autor possuía acerca de escritos romanos. Ao se utilizar de textos como: a Eneida, do poeta latino Virgílio, os do historiador Salústio, e de narrativas presentes na obra de Tito Lívio, entre outros, Santo Agostinho os utiliza de modo a argumentar em defesa da religião cristã e de seus seguidores.

Além de se apropriar dos textos romanos para criticar seus próprios costumes, Santo Agostinho também faz uso de personalidades e de fatos históricos para elucidar sua exposição. Um dos principais exemplos utilizados pelo autor se trata da figura de Lucrécia (Página 48, capítulo XIX), amplamente exaltada pelos romanos por se tratar de um virtuoso exemplo de mulher e por ter se matado após ter sido vítima de um estupro. Ao inserir essa personagem da história de Roma em seu texto, Santo Agostinho faz uso dela para engenhosamente: criticar os costumes e desconstruir as figuras de veneração romana, argumentar contra a prática do suicídio – totalmente condenada pela religião cristã – discursar sobre a dualidade corpo e alma, e, a partir disso, justificar o fato do por que das mulheres cristãs, após terem sido abusadas sexualmente, não tiravam sua própria vida.

Além de Lucrécia, outras figuras romanas que aparecem no Livro I são: Régulo, Catão, Cipião de Nasica, que era contrário à destruição de Cartago e contra as construções de teatros em Roma; e, como já foi dito, Santo Agostinho também insere acontecimentos históricos em seu texto, como, por exemplo, as Guerras Púnicas.

Por mais que se trate de um texto cuja leitura seja relativamente difícil, é interessante lermos os escritos de Santo Agostinho, tanto pelo fato dele ter vivido no contexto das invasões bárbaras e de ter formulado para elas a sua própria interpretação, como pelo fato dele ter se apropriado de diversos autores e fontes – algumas das quais felizmente ainda hoje temos acesso – para desenvolver o seu discurso em favor das crenças cristãs.


3. Vocabulário cristão: a importância da linguagem para a obra de Santo Agostinho


Um ponto que se destaca por todo o pensamento agostiniano é o uso do vocabulário, e, além desse vocabulário – que vulgarmente os atuais cristãos utilizam em conversas e reuniões –, destaca-se alguns aspectos elencados por Santo Agostinho em alguns capítulos de seu livro para a formação do cristão, entre os quais temos a linguagem e a necessidade do conhecimento da escrita e das letras (ou seja, os cristãos devem antes analisar as escrituras bíblicas à luz da razão – influência neoplatônica, filosófica –, ideia essa que foi aprimorada posteriormente por Tomás de Aquino 1225-1274).

Atualmente, os teólogos por formação utilizam-se dos recursos da linguagem, como: metáforas, alegorias, comparações, diálogos com perguntas e respostas didaticamente organizados. O próprio Agostinho se utiliza de muitas comparações no decorrer da sua obra para levar os leitores a entender conceitos complexos e abstratos por meio de assuntos conhecidos. Ou seja, de seu ponto de vista, não se trata de ensinar apenas palavras, mas também o que elas significam, o conteúdo que elas transmitem e, por isso, à medida que o leitor conhece o significado das palavras, aprenderá também acerca das várias crenças cristãs.

Para entendermos o valor do vocabulário e por meio de que Agostinho fundamentou a sua filosofia, temos que ter em mente que, a princípio, o cristianismo não proporcionou para Agostinho a razão do mal (os textos bíblicos, antes de serem reveladores, não possuíam um teor racional e investigativo; e foi justamente Agostinho que buscou preencher essa lacuna por meio da filosofia), porém, ao se utilizar dos sistemas filosóficos do neoplatonismo como um fator crucial e modelador para a “filosofia cristã” e seu vocabulário – e não só de Platão, mas de ideias aristotélicas, estoicas, ciceronianas etc. –, Santo Agostinho satisfez suas ideias e curiosidades concebendo Deus não de uma maneira corpórea e materialista, que não explicava a criação do mal, mas como um ser transcendente.

Agora, poderia existir uma realidade espiritual infinita; atemporal; imaterial; e para que o homem a desfrutasse bastaria que ele, enquanto criador da maldade, se desprender dos vícios terrenos. É através desse dualismo (vide o neoplatonismo, o maniqueísmo, o gnosticismo) entre o bem e o mal que o mundo seria regido, sendo o bem: o espiritual (Deus, cidade espiritual) e o mal: o material (Diabo, cidade terrena).

Do mesmo modo que o bem e o mal se distinguem, o corpo e a alma também são regularizados nessa temática dualista, como, por exemplo, Santo Agostinho licencia que “Tal submissão [submissão divina, para com Deus] aumenta-lhe a reserva espiritual”, ou seja, acresce a sua alma. Por outro lado, ele se utiliza da fala de um apóstolo que diz que “a cupidez é a raiz de todos os males”, quer dizer, a ambição humana – corporal – é a grande causadora dos males terrenos. Finaliza a sua fala concluindo que, “Não amontoeis para vós tesouro escondido na terra [...] não desprezando o mestre verdadeiro, o mais fiel e invencível guardião de seu tesouro”, pois bem, vemos que a alma sobrepõe ao corpo, salvaguardando a relação entre bem (a alma) mal (o corpo) (página 38-39, capítulo X).

Além dessas relações dicotômicas, observamos uma singularidade em termos como: destino; profano; carne; providência; virtude; castidade; razão; fome; pecado; espírito; penitência; castigo; fé; santidade etc. Em suma, sua obra trás um conteúdo que revelaria o modo (e a conduta) de ser cristão, a fim de que as pessoas superassem o flagelo da cidade terrena e posteriormente fossem morar no reino de Deus.


4. As causas alegadas por Santo Agostinho para o declínio de Roma

Diante dos acontecimentos de seu presente: as crises que assolavam o poderio do Império Romano, Santo Agostinho, assim como vários outros escritores contemporâneos do declínio de Roma, também apresenta a preocupação de explicar como que essa cidade caiu em ruínas.

A primeira causa que nos é alegada para a decadência de Roma, e uma das que mais podem ser notadas em seu texto, está relacionada aos deuses que eram cultuados pelos romanos. De acordo com Santo Agostinho, os deuses que faziam parte do imaginário romano, tais como as deusas Juno e Minerva, não passavam de estátuas que eram adoradas pelos homens, sendo assim, era impossível que os romanos fossem por elas protegidos. Ao analisar as narrativas produzidas por poetas romanos, como a Eneida de Virgílio, Santo Agostinho chega à conclusão de que os deuses romanos foram os vencidos da história, e por isso direciona críticas à ingenuidade dos romanos por acreditarem nesses deuses perdedores.

Além de ser essa cidade habitada por adoradores de deuses, os quais Santo Agostinho qualifica como escravos, Roma também era, segundo Santo Agostinho, uma cidade dominada por paixões insaciáveis e desenfreadas: a ânsia por domínio e por conquista, a própria prosperidade experimentada pelos romanos; a ambição, a avareza, a infidelidade e a libertinagem por parte da população, sendo tudo isso motivos para a causa da corrupção romana.

Embora Santo Agostinho não tenha sido historiador, é interessante notar que no capítulo XXX do Livro I ele define que o marco da decadência de Roma seriam as Guerras Púnicas, ou seja, os conflitos vivenciados por Roma versus Cartago. De acordo com o autor, foi depois que Roma destruiu a inimiga Cartago que ela começou a se tornar uma cidade viciosa e cheia de desgraças: guerras civis, sedições, insegurança, entre outros.

Para mais, um curioso motivo para o declínio de Roma que nos é mencionado pelo autor se trata do teatro romano. Conforme Santo Agostinho nos relata, as artes cênicas, por se tratarem de um espetáculo qualificado pela vaidade, pela libertinagem e pela desonra, se constituem em outra causa para a perda da moral romana. (Nesse ponto nos vem à memória o sarcasmo presente na obra de Petrônio – o texto da peça Satiricon –, que ridiculariza a decadência dos costumes da sociedade romana, e as cenas de teatro presentes no filme de Fellini, baseadas na obra do escritor romano).

Diante desses apontamentos feitos por Santo Agostinho para os motivos que levaram à degeneração romana, observamos que o escritor, ao escrever em defesa dos cristãos, que estavam sendo acusados pelos romanos de serem a causa da decadência de Roma, associa a situação do declínio de Roma sobretudo ao desgaste moral da população, inclusive muito mais do que às invasões dos povos bárbaros que ele mesmo estava presenciando: “Variedade inesgotável de prazeres, louca prodigalidade, enfim, prosperidade fecunda em ruína moral, bem mais terrível que o gládio inimigo, eis o que buscais.” (Página 60, capítulo XXX).

Aliás, é interessante pontuar como que Santo Agostinho se apropria desse acontecimento de seu tempo, as invasões bárbaras, para construir um discurso em favor da bondade de seu Deus cristão. Para o escritor, diferentemente das populações que acreditavam em deuses, e que quando eram subjugadas por algum povo inimigo acabavam tendo no templo o local símbolo de sua derrota, as basílicas cristãs, dada a ocasião das invasões bárbaras, acabaram servindo de refúgio e de proteção não somente para os cristãos, mas também para os romanos. Os próprios bárbaros eram quem indicava e conduzia a população para as basílicas, e isso, de acordo com Santo Agostinho, não era em virtude de seus costumes, mas sim de intervenção de Deus (Página 34, capítulo VII).


5. Fim da vida temporal: Santo Agostinho e a morte


Antes de finalizar o Livro I, Santo Agostinho destina alguns dos últimos capítulos para tratar sobre a morte: a prática do suicídio (ou, morte voluntária), o homicídio, além de questões em torno do sepultamento. É interessante notar que, ao falar sobre uma temática enraizada em misticismos e atrelada ao desconhecido, Agostinho busca naturalizar o irremediável. Aliás, morrer, segundo ele próprio, é uma “sorte cruel”. (Página 40, capítulo XI).

A morte que nos é apresentada através do bispo de Hipona é uma morte sem escalas ou hierarquização. Morremos e é isto. Não há uma morte melhor ou uma pior. Além de não possuirmos o controle de qualificá-la, não temos também o controle da vida, não saberemos se ela será longa ou curta - vemos que Agostinho ignora o fato de que ela signifique outra coisa, ela é pura e substancialmente: a morte (o fim temporal).

Santo Agostinho é convicto em dizer que, a morte não representa nenhum mal [...]”, contudo, “[...] se sucede a vida santa; não pode ser mal senão pelo acontecimento que a segue” (Página 41, capítulo XI). Logo, temos em mão um entrave rapidamente resolvido. Ao ler o seguimento de seu raciocínio, observamos no capítulo XI que, aquilo que declara se a morte será algo bom é a atemporalidade que se é conquistada através da salvação, a eternidade na cidade de Deus – mas, para isso, o cristão deve viver bem, deve se submeter às vontades de Deus.

A primeira revisão que nos é dita por Santo Agostinho é a de que ele não encontra sentido em falas que degradam os cristãos pelo fato de deixarem cadáveres insepultos. Para somar, o próprio se utiliza de passagens bíblicas para falar sobre o sepultamento, pois, segundo ele, foi prometido aos fiéis que a carne e os membros seriam restituídos à primitiva integridade – vide o texto em Zacarias 9: 11-12. Mas, essa ausência de ritualidade não impede que ele afirme que o morto não é motivo para ser deixado com desdém e ao abandono (em especial os dos justos e fiéis).

Além disso, Agostinho analisa o caso de Lucrécia, pondo à prova a pureza de sua alma. Para tal, ele discute a profanação corporal e o seu suicídio. Interessante notar que, Santo Agostinho postula o suicídio como um pecado (o argumento é baseado no mandamento “Não matarás”, bem como na ideia que a vida é um dom doado por Deus e que não deve ser desprezado, além de que o suicídio interfere na ordem “natural”), ou seja, estorva os desejos de Deus. Segundo o bispo Agostinho, “não é sem motivo que em parte alguma, nos livros sagrados e canônicos, se poderia encontrar que, mesmo em relação à imortalidade, para prevenir ou conjurar algum mal, tenha Deus ordenado ou permitido que alguém se matasse” (Página 50, capítulo XX).

Mas se a questão é o suicídio, cabe para nós, enquanto historiadores, analisar que a bíblia relata seis suicídios ao todo, sendo que em cinco dos casos foram homens pecadores e perversos que tiraram suas próprias vidas e o sexto personagem é Sansão – um dos grandes heróis bíblicos. Será, então, que é possível rediscutir o pecado do suicídio, contrapor os preceitos religiosos e perdoar, também, a Lucrécia? Ou ir mais além: arquitetar um embate entre o patriotismo de Tito Lívio versus a fé de Santo Agostinho, e considerar o caso de Lucrécia tão respeitável quanto a autoimolação ou o Seppuku - vulgarmente conhecido como harakiri, no ocidente.

Porém, dificilmente chegaríamos a um acordo, pois que Agostinho não tardaria em dizer, “exceto as referidas exceções, em que o homicídio é ordenado por lei geral e justa ou por ordem expressa de Deus [Sansão e a filha de Jetfé]; fonte de toda justiça, quem mata o irmão ou si mesmo é réu do crime de homicídio” (Página 51-52, capítulo XXI). No mais, Santo Agostinho deixa enfático que “toda pessoa que se mata é homicida”. (Página 46, capítulo XVII). Logo, em hipótese alguma haveria perdão para Lucrécia.


6. O Deus cristão e o comportamento de seus seguidores


Pelo fato de Santo Agostinho ter se convertido ao cristianismo e de A cidade de Deus ter como um de seus objetivos a defesa dos cristãos diante das acusações dos romanos, ao longo do Livro I podemos apreender diversos aspectos relacionados às concepções e práticas dos povos cristãos. Primeiramente que estes, diferentemente dos romanos, que acreditavam em vários deuses, vão acreditar, segundo as palavras de Santo Agostinho, em um “único e verdadeiro Deus” (Página 53, capítulo XXII).

Esse Deus cristão que encontramos na obra é caracterizado por ser onipresente e ilimitado, e ao submeter os seus seguidores a sofrimentos é com a finalidade de prová-los ou de castigá-los pelos pecados e, desse modo, conceder-lhes a vida eterna (Página 59-60, capítulo XXIX). O sofrimento, que pode ser vivenciado por meio dos males provocados pelo inimigo, pela perseguição, pela penitência e pela fome, é algo que o cristão deve enfrentar, pois esse sofrimento “de um lado é provação que justifica; doutro, castigo que ensina.” (Página 58, capítulo XXVIII). Diante disso, essa questão da provação e do ensinamento é muito marcada pela noção de Providência pregada pelos cristãos, a qual está relacionada com a preparação de maravilhas para os justos, que as desfrutarão na eternidade, enquanto que os maus e os infiéis experimentarão desgraças.

Além disso, por acreditarem em uma Cidade de Deus, caracterizada por se situar no futuro e por ser eterna, os cristãos consideram que a vida neste mundo é passageira, e, desse modo, pregam o desapego à riqueza e às coisas materiais. Por serem consideradas instáveis, o cristão não deve ter como objeto de desejo as riquezas, mas sim se empenhar em agradar à Deus por meio da caridade e da distribuição de esmolas, e, através disso, garantir a sua vida eterna (Página 39, capítulo X). Ademais, outras características que são bastante enaltecidas e aconselhadas pelo cristianismo aos seus seguidores são: a pobreza (Página 40, capítulo X), a castidade do corpo, mas principalmente a da alma, assim como o batismo, a fidelidade na relação conjugal e a virgindade por parte dos cristãos (Página 54, capítulo XXIV), além de eles se demonstrarem pacientes e esperançosos na crença de um futuro melhor, ou seja, na Cidade celeste.


Referência:

AGOSTINHO, Santo. A cidade de Deus: Parte I. Tradução de Oscar Paes Leme. Brasil: Vozes, 2014.

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