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Em 1880, o Império do Brasil era o maior construtor de estradas de ferro do mundo?

Atualizado: 7 de out. de 2020

A série “Narrativas monarquistas” continua e, desta vez, a equipe do PROJETO DETECTA investigou se o Império do Brasil foi realmente o maior construtor de estradas de ferro do mundo em 1880, com mais de 26 mil km construídos, segundo informações que circulam pela internet.

Há pouco mais de um mês, o Projeto Detecta iniciou a série “Narrativas Monarquistas”, com o propósito de checar conteúdos divulgados pelos simpatizantes do velho regime (não confundir com o conceito de “antigo regime”). Um desses conteúdos afirma que, em 1880, o Império do Brasil “foi o maior construtor de estradas de ferro do mundo, com mais de 26 mil Km”. Essa informação aparece em várias páginas da internet e nas redes sociais, porém, sem acompanhar fontes para verificação.


Entre os propagadores dessa narrativa, estão a página Pedro II do Brasil, do Facebook, e alguns tuítes de pessoas aleatórias, conforme os prints abaixo.

Print de postagem da página Pedro II do Brasil, no Facebook, de 22 de setembro de 2016
Print do Twitter
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A informação é reproduzida até por um blog que se coloca como especializado no tema, denominado Ferrovia Vez e Voz, o que confere um ar de legitimidade aos dados, apresentados com destaque entre outras “Curiosidades do Império brasileiro”, como aparece no título da publicação de 25 de julho de 2016.


Print de fragmento de postagem publicada no blog Ferrovia Vez e Voz em 25 de julho de 2016

É importante destacar que, ao final da postagem, o blogueiro faz referência a uma lista de “fontes bibliográficas”. Ele inclui a observação de que aquelas informações “circulam livremente pelas redes sociais, sem identificação do autor.” Ficamos com uma dúvida: será que o autor não identificado teria realmente acessado todas as fontes mencionadas? É hora de investigar.


Pesquisa


Antes de verificar se o Brasil tinha mesmo esses “26 mil km” de ferrovias em 1880, é preciso compreender o contexto global de expansão do capitalismo industrial e seu impacto fora da Grã-Bretanha, a grande potência industrial e império colonial do século XIX. Nem todos os países e colônias que adotaram ferrovias como transporte apresentaram as mesmas consequências. O impacto da industrialização e da adoção de estradas de ferro dependia do ambiente natural, da economia e até mesmo da cultura de cada região. Por exemplo, o Brasil receberá isso de uma maneira, os Estados Unidos de outra, bastante diferente.


Como diz Winston Churchill, “cada caso é um caso” (alerta de churchillian drift!). As especificidades regionais demandam respostas variadas para perguntas básicas. Por exemplo: de onde veio a tecnologia adotada e como cada país lidou com suas necessidades relacionadas às estradas de ferro? Como cada um expandiu suas redes ferroviárias e em que quantidades em cada época?


Entende-se por ferrovias, desde 1825, o padrão de vias construídas em ferro ou aço com veículos puxados por locomotivas a vapor. As ferrovias, ou estradas de ferro – outro nome para a mesma coisa –, podem ser consideradas um grande símbolo do desenvolvimento tecnológico do século XIX.


Por mais que o desenvolvimento de tecnologias alternativas já fosse uma coisa presente nas últimas décadas do século XIX, a locomotiva a vapor – popularmente chamada de “maria fumaça” – foi o principal veículo a tracionar os trens até algumas décadas atrás. Mas, o que nos importa nesta investigação é como isso ocorreu no século XIX, especialmente no período monárquico brasileiro (1822-1889).


A primeira ferrovia considerada como transporte público ferroviário com tração a vapor foi a Stockton & Darlington, na Inglaterra, inaugurada em 1825. Seu sucesso foi tão estrondoso para o grande público, que esse meio de transporte logo tomou de assalto os desejos de governantes e homens de negócios de todos os continentes.



Talvez devido à precocidade do projeto e à ausência de legislação para esse tipo de empreendimento, esse desejo não tenha prosperado. Mesmo que Grace tenha insistido até os anos finais da década seguinte, nada aconteceu além de uma vontade. Porém, nesse ínterim, Bernardo Pereira de Vasconcelos, senador por Minas Gerais, escreveu um projeto de lei que se transformou no primeiro decreto-lei assinado pelo então novo regente, Diogo Feijó, o que levou o Decreto-Lei nº 101 a ser chamado de “Lei Feijó”. Nascia, assim, em 1835, o primeiro projeto oficial para permitir a construção de ferrovias no território brasileiro.


Apesar da Lei Feijó e do pedido de César Cadolino de 1838 para construção de uma estrada de ferro entre São Cristóvão (Rio de Janeiro) e São João del-Rei, na província de Minas Gerais, apenas em 1852 houve o início da construção da primeira ferrovia do Brasil. A ferrovia de Mauá, da Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis, deu esse pontapé, apresentando uma estrada de ferro de 14 km entre o porto de Mauá e Fragoso, com operação iniciada em 1854.


Porém, uma companhia de estrada de ferro com um projeto de conectar capitais do Império, como propunha a Lei Feijó, só veio a ser incorporada em 1855. A Companhia Estrada de Ferro Dom Pedro II (CEFDPII), que construiria e operaria a Estrada de Ferro Dom Pedro II (EFDPII), tinha como missão cumprir o projeto estabelecido por Vasconcelos vinte anos antes. Esse projeto era conectar a Corte do Rio de Janeiro ao Rio Grande (do Sul), no sentido sul, e Ouro Preto e Salvador, no sentido norte.


Assim, com a “ferrovia de Dom Pedro”, se iniciava o “surto ferroviário brasileiro”, na expressão do engenheiro José Luiz Baptista.


Grande parte das ferrovias construídas no centro-sul (atual Sudeste) entre 1870 e 1889 foram ramificações da EFDPII. Essa, além de primeira ferrovia de grande porte, era a mais importante política e estrategicamente. A linha tronco – ou seja, principal – dessa estrada adentrava pela província de Minas Gerais em direção a Ouro Preto e seu principal ramal – ou seja, linha secundária – partia do tronco ainda em Barra do Piraí, RJ, em direção a Cachoeira Paulista, SP. Essa estrutura pode ser vista na planta geral de Alexandre Speltz, de 1885.

Se entre a primeira ferrovia no Reino Unido e a primeira ferrovia no Brasil se passaram trinta anos, os trinta seguintes foram de grande agitação para a expansão desse meio de transporte no Brasil (assim como no resto do mundo). Apesar de Bahia e Pernambuco terem construído duas entre as cinco primeiras estradas de ferro do país, esse efeito expansivo se deu principalmente entre as províncias de Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. A economia cafeeira foi um fator muito importante para essa expansão ferroviária, porém, não foi um fator isolado.


Uma das principais razões para tantas ferrovias serem propostas e outras tantas serem construídas, segundo os historiadores Flávio Saes, Maria Lúcia Lamounier, Almir Chaiban El-Kareh e outros, foi a adoção da garantia de juros de 7% sobre o capital a partir de 1852. Para quem se perguntar o que era essa tal garantia de juros, explicamos: era uma forma de o governo pagar por parte da construção das obras de infraestrutura. Chama-se garantia de juros porque significa que, enquanto a companhia não conseguisse ter lucro, o governo garantia o pagamento de 7% anual do valor investido por pessoa que adquirisse ações de cada empresa. Esse valor era interessante para muitos, já que a poupança pagava apenas 5%.


Tal garantia passou a ser possível a partir da Lei nº 641, de 26 de junho de 1852, que melhorava as propostas da Lei Feijó para uma ferrovia que conectasse a Corte do Rio de Janeiro às províncias do Império. Um dos resultados dessa lei foi a grande expansão ferroviária ocorrida entre 1855 e 1889, recebendo outras leis complementares nos anos seguintes. A partir de 1855, permitiu a existência da própria EFDPII. Depois de 1860, permitiu o boom de companhias e suas estradas de ferro no resto do país. Um grande número delas eram ramificações que partiam do tronco e de ramais da EFDPII.


A expansão derivada da Pedro II teve resultados interessantes, entre os quais uma situação que em muito se deve à política adotada pelo diretor-presidente da CEFDPII, Cristiano Ottoni: a contratação de engenheiros estadunidenses para construir a ferrovia EFDPII a partir de 1858. Essa escolha pelos “americanos” se devia a uma insatisfação geral sobre o contrato com o inglês Edward Price, que iniciara a construção, tendo entregado o primeiro trecho da estrada, que ligava a cidade do Rio de Janeiro à antiga localidade de Belém (atual Japeri, RJ).


Como consequência dos trabalhos dos norte-americanos na EFDPII, e a grande influência exercida por ela entre as estradas de ferro posteriores, já no século XIX é possível dizer que havia uma predominância de características americanas em nossas ferrovias. Isso não implicou a eliminação dos britânicos, pois esses continuaram com várias formas de participação. Inclusive, britânicos eram detentores de algumas companhias, como a mais rentável entre todas no território brasileiro: a Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, da britânica São Paulo Railway Company.


Assim, voltamos às perguntas que dão razão a esta investigação: o Império do Brasil era realmente o maior construtor de estradas de ferro do mundo em 1880? Teria nessa época mais de 26 mil km construídos no país?


No livro A Construção da Ordem/Teatro das Sombras, o historiador José Murilo de Carvalho diz que “[o] Império construiu entre 1854 e 1889 cerca de 10 mil quilômetros de estradas de ferro”.


A informação trazida por José Murilo, citado como referência no blog Ferrovia Vez e Voz, ainda não nos convenceu. Porém, ajuda-nos a iniciar uma busca por mais detalhes. Para isso, veremos alguns autores que fizeram pesquisas sobre estradas de ferro no século XIX brasileiro e algumas fontes primárias.


O historiador e economista William Summerhill apresenta, em seu livro Order Against Progress, uma tabela baseada no Repertório Estatístico do Brasil. Segundo esses dados, em 1880 o Brasil chegou a 3.398 km de estradas de ferro. Devemos notar que, em 1913, segundo os mesmos dados, o Brasil ainda não havia alcançado os “26 mil km” propagados pelas redes sociais monarquistas. Em 1889, assim como José Murilo indica de forma resumida a proximidade de “10 mil km”, a tabela entrega o valor de 9.583 km.

Tabela extraída do livro Order Against Progress, de William Summerhill, de 2003, p. 52

Não satisfeitos, fomos atrás de uma publicação brasileira. Então, encontramos o livro da historiadora Maria Lúcia Lamounier, Ferrovias e Mercado de Trabalho no Brasil do Século XIX. Também em uma tabela, Maria Lúcia apresenta a evolução da quilometragem das ferrovias brasileiras. Apesar de uma leve discrepância para o ano de 1862, os números são basicamente os mesmos. A tabela que ela apresenta, porém, é mais simples e abarca um período um pouco mais curto, 1854-1900. Baseada nas Estatísticas Históricas do Brasil. Séries Demográficas e Sociais, de 1550 a 1985, repete os mesmos números para os anos de 1880, 1889 e 1900.

Tabela extraída do livro Ferrovias e Mercado de Trabalho no Brasil do Século XIX, de Maria Lúcia Lamounier, de 2012, p. 73

Para complementar, buscamos um autor do próprio século XIX, contemporâneo dos números. Em publicação de 1886, denominada Estudo Descriptivo das Estradas de Ferro do Brasil, Cyro Diocleciano Pessoa Jr. traz uma tabela com números bastante detalhados. De acordo com esse estudo, no ano de 1885, o Brasil possuía, em tráfego, 6.512,90 km de estradas de ferro. A mesma tabela informa que havia em construção 2.083,63 km, o que totalizaria 8.596,53 km. Esses valores, apanhados na contemporaneidade do momento, estão dentro das perspectivas dos números compilados pelo IBGE mais tarde.


Para completar os 6.930 km das tabelas de William Summerhill e Maria Lúcia Lamounier referentes ao ano de 1885, seria bastante verossímil que até o final daquele ano os construtores terminassem mais 417 km de estradas de ferro para constar nas fontes oficiais futuras.


Agora, verifiquemos o que o Relatório do Ministério da Agricultura, encabeçado por José Antônio Saraiva, também secretário, dentro do ministério, para Agricultura, Comércio e Obras Públicas de 1880/1881 tem a nos dizer. Naquele período, os anos de 1880 e 1881 ficaram acumulados. Assim, os dados do ano 1880 não foram computados separadamente. Portanto, dentro dos relatórios do ministério responsável pela fiscalização e administração dos assuntos das “ferro-vias”, os valores de 1880 são encontrados dentro do relatório de 1881-1 (sim, há dois relatórios para 1881).

Parte do índice do Relatorio Apresentado à Assembléa Geral na Primeira Sessão da Decima Oitava Legislatura pelo Ministro e Secretario de Estado Interino dos Negócios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, José Antonio Saraiva em 1882, referente aos anos de 1880 e 1881

O relatório referente a 1881 apresenta 2.026,63 km em tráfego e 2.643,59 km em construção. Em 1882, esses valores se ampliam para 3.911,90 km em tráfego e 2.931,03 em construção. Com isso, é possível verificar que a quilometragem de cada ano é um meio termo entre o que havia “em tráfego” e o que havia “em construção”. Logo, apesar de os números dos relatórios dos ministérios não serem exatamente os das estatísticas apresentadas anos mais tarde, eles demonstram uma média entre o que existia e o que seria entregue a cada ano.


Portanto, fica comprometida também a ideia de que, durante o período monárquico, o Brasil tenha construído mais estradas de ferro do que no período republicano. Pois, se entre 1854 e 1889 – 35 anos – o Império do Brasil construiu em torno de 10 mil km de ferrovias, entre 1890 e 1913 – 23 anos – os Estados Unidos do Brasil (nome oficial do país naquela época) construíram em torno de 15 mil km. Às portas da Primeira Grande Guerra, marco que alguns historiadores chamam de fim real do século XIX, o Brasil alcançava o total de 25 mil km de ferrovias, trinta e cinco anos mais tarde do que encontramos pela internet adentro.

Para arrematar a pergunta “o Império do Brasil era realmente o maior construtor de estradas de ferro do mundo em 1880?”, falta verificar o ambiente exterior de expansão de ferrovias. Infelizmente, não encontramos uma tabela global sobre quilometragem de ferrovias por país no século XIX, exceto uma pequena tabela da Modern History Sourcebook: Spread of Railways in 19th Century (livro de referência da história moderna: expansão das ferrovias no século XIX), encontrada na Fordham University.

O problema dessa tabela é sua concentração em países europeus. O que impede uma noção mais apurada da expansão, que é um fenômeno global. Nesse aspecto, não devemos desconsiderar o esforço imperialista britânico, em suas colônias, para construção de ferrovias nos seus vários domínios. Mesmo assim, é possível ter alguma noção, considerando os 18.507 km do Império Austro-Húngaro, os 23.089 km da França, os 33.838 km da Alemanha, os 25.060 km da Grã-Bretanha, os 9.280 km da Itália, os 22.865 km da Rússia, os 7.490 km da Espanha e os 5.876 km da Suécia. Porém, entendemos desnecessário esse levantamento global, já que é possível comparar com um país de dimensões próximas às brasileiras em 1880 e que era um território do mesmo continente: os Estados Unidos da América.


A primeira ferrovia dos Estados Unidos, oficialmente, foi a Baltimore & Ohio Railroad, de 1827, que inspirou a construção de outras. Em 1831, a região Nordeste dos EUA já iniciava um processo de industrialização para atender à crescente demanda por locomotivas mecânicas em um contexto de febre ferroviária. O abolicionista e artesão Mathias Baldwin abriu sua oficina para construção de locomotivas a vapor, que se tornaria a maior fábrica de produtos para ferrovias na entrada do século XX. Essa fábrica já era a maior do mundo em 1880 e, inclusive, nesse tão importante ano, já era o maior fornecedor para as ferrovias brasileiras.


Entre 1862 e 1889, a EFDPII encomendou 169 locomotivas nos EUA. Somadas, as ferrovias do Brasil encomendaram, apenas à Baldwin Locomotive Works, em torno de 337 locomotivas. Esse é o número apresentado pela documentação do fabricante, encontrada na Biblioteca DeGolyer, da Universidade Sul Metodista do Texas. Já o Inventário Geral de Locomotivas (IGL) da Sociedade de Pesquisa para Memória do Trem (SPTM) apresenta um número mais tímido, de 325, mas ainda considerável. O total de locomotivas para as ferrovias do Brasil entre 1854 e 1889 teria sido de 460 unidades, segundo esse mesmo inventário da SPMT, que nos permite gerar o seguinte quadro para indicar a origem da tecnologia de maior valor agregado empregada nas estradas de ferro brasileiras:

Tabela elaborada pelo autor com base em dados levantados na pesquisa.

A princípio, essas informações parecem uma bobagem. Mas se encaixam no argumento maior sobre a nem tão imensa rede ferroviária do Império do Brasil em escala mundial, como propagam as páginas monarquistas nas redes sociais e em outros cantos da internet. Um estado soberano e devidamente “liberal” e “avançado” não apenas investiria na construção de ferrovias para atender às suas demandas de agroexportação de café, algodão e açúcar, mas, também se preocuparia com o desenvolvimento de uma indústria metalúrgica para atender a essa grande demanda ferroviária por maquinário de grande complexidade, coisa que o Tio Sam fez, como demonstram os quadros seguintes, comparativos entre Grã-Bretanha e EUA.

Em 1850, quando o Império do Brasil sequer havia levado a cabo os projetos de 1827, de Carlos Grace, e de 1835, de Bernardo Pereira de Vasconcelos, os Estados Unidos já possuíam pelo menos cinco oficinas/fábricas de locomotivas (quadro acima) e haviam construído cerca de 9 mil milhas (14 mil km) de estradas de ferro. Esse valor pode ser encontrado no livro American Railroads and British Investors, de S. F. Van Oss, publicado em 1893. Segundo o autor, havia 54.202 km em trilhos de aço contra 131.913 km em trilhos de ferro nos Estados Unidos de 1880. Uma década depois, 270 mil km eram do melhor metal e apenas 65 mil km permaneciam de ferro: “and everybody who knows how much the capacity of a steel track exceeds that of an iron, will understand what economies this change alone rendered possible” (e todo mundo que sabe o quanto a capacidade de um trilho em aço excede a capacidade de um em ferro, entenderá quais economias essa mudança, sozinha, possibilitou), conclui Van Oss.

Esse texto, que não tem a preocupação principal de disputar tamanho de rede ferroviária, nos dá uma boa noção sobre a dimensão do avanço das ferrovias pela América do Norte, particularmente nos Estados Unidos. Ele indica que, em 1880, se o Brasil possuía 3.398 km de estradas de ferro, os Estados Unidos já possuíam em torno de 186 mil km e já discutia o maior valor do uso do aço em detrimento do uso do ferro para suas vias. Em 1890, portanto no primeiro ano de regime republicano, o Brasil possuía em torno de 10 mil km e os Estados Unidos haviam elevado sua rede ferroviária a mais de 300 mil km, além de possuir um imenso parque industrial para atender essa expansão.


Conclusão: LOROTA!


O período imperial brasileiro coincide com um fomento internacional para a modernização das redes viárias. A segunda revolução industrial e uma de suas principais características, que era a predominância da máquina a vapor, gerou um impacto global em que as estradas de ferro foram “fato e símbolo”, como disse o historiador da arte William Curtis em Arquitetura Moderna Desde 1900. Por seu valor simbólico e logístico, a ferrovia foi adotada em territórios de todos os continentes em uma velocidade que poderíamos chamar de alucinante. Não à toa, até mesmo o primeiro filme, dos Irmãos Lumière, traz como tema a chegada de um comboio ferroviário a uma estação (L'Arrivée d'un train en gare de La Ciota, de 1895). Era o meio de transporte do e para o século XIX. Constituiu-se como parte de projetos e ações de uma civilização capitalista e, também, de base predominantemente liberal e imperialista anglo-saxônica. Considerando os dados levantados por essa investigação, a equipe do Projeto Detecta conclui que a narrativa verificada não procede: o Brasil não era o maior construtor de estradas de ferro do mundo em 1880 e só durante o período republicano alcançaria a marca de 26 mil quilômetros construídos.


Pesquisa e redação: Welber Santos*


*Doutorando em História pela Universidade Federal de Ouro Preto. O texto acima foi produzido com exclusividade para o Projeto Detecta e inclui resultados de sua pesquisa de doutorado, que são tratados aqui de forma mais sucinta e adequada ao público não especializado.

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