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"Que se rinda tu madre": a revolução nicaraguense contada por suas lideranças

Atualizado: 30 de jan. de 2020

(Por Lucas Tadeu. Graduando do curso de história da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e bolsista do programa de Educação Tutorial da mesma instituição (PET).

O desacordo entre o sonho e a realidade nada tem de nocivo se, cada vez que sonha, o homem acredita seriamente em seu sonho, se observa atentamente a vida, compara suas observações com seus castelos no ar e, de uma forma geral, trabalha conscientemente para a realização de seu sonho. (LENIN, 1902, pág. 91)

O dia 19 de julho de 1979 deveria ser transcorrido de modo ordeiro e dentro da normalidade na América Central, mas não foi. A Nicarágua, até então desconhecido país, atraia para si a atenção do mundo. Um bando de guerrilheiros capitaneava a última revolução popular de grande vulto do século XX e, de quebra, derrubavam do poder a mais longa ditadura registrada na América latina, a da família Somoza. É sobre estes personagens e a respeito desse movimento insurrecional popular que levantaremos algumas provocações ora em diante. Ancorados estaremos em uma modesta, mas importante bibliografia concernente a temática, metodologicamente pretendemos expor a visão particular de atores diretamente envolvidos no episódio em tela, a partir de um conjunto de entrevistas organizado na coletânea obra de Gabriel Invernizzi.

As conversações iniciaram-se no inverno de 1984, cinco anos, portanto, após a Revolução. A escolha dos entrevistados se deu porque eles foram membros das três tendências mais à esquerda, que aliada a uma débil burguesia, insatisfeita também como os rumos dado a Nicarágua pelos Somozas, catalisaram o descontentamento e os longos anos de opressão vividos pelas massas, que remontam as batalhas por sua independência junto a Espanha e posteriormente um longo histórico de controle empreendido pelos Estados Unidos em seu território, para deflagração do movimento insurrecional.

Compuseram também a Direção Nacional da Frente Sandinista, formada por nove comandantes, foi o órgão revolucionário responsável por ora em diante governar o país. Bayardo Arce foi o encarregado de responder as perguntas referentes ao partido, usaremos suas falas para discutir a promoção das eleições chamadas em 1984, bem como o alcance e recepção de uma oposição a FSLN. Jaime Wheelock, como ministro da Agricultura e da Reforma Agrária, trará sua concepção quanto aos limites da distribuição de terras realizada pós revolução e, finalmente, Humberto Ortega, ministro da Defesa, nos informa da dificuldade de organização, uma vez que tivera de ser mantido cotidianamente um estado permanente de defesa do processo revolucionário mediante as agressões norte-americanas, que financiavam, treinavam e concediam armas as tropas dos “contra” revolucionários.

A marcha vitoriosa dos insurgentes a capital Manágua sob a direção da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) lembrava em alguns aspectos o que havia acontecido vinte anos antes em Cuba. Tal como os guerrilheiros liderados por Fidel Castro e os demais companheiros protagonistas da Revolução Cubana de 1959, os corajosos e obstinados combatentes nicaraguenses, de lenços pretos e vermelhos em seus rostos, combinavam táticas de guerrilha rural, assimiladas sobretudo nas montanhas, de onde muitos provinham, com os levantes urbanos, que, como veremos, foi de extrema importância e compunha um setor considerável dos homens que ousaram se levantar contra o imperialismo norte americano.

Estes homens, cubanos e nicaraguenses, estavam absortos na busca por sua autonomia política, econômica, social e cultural. Ambos tinham a reforma agrária e os direitos dos trabalhadores como bandeiras de luta, além de promoveram a queda de longas e perniciosas ditaduras. No caso cubano, Fulgêncio Batista fugiu para Miami, mesmo destino tomado por Anastasio Somoza, cuja oligarquia carcomida desgovernava a Nicarágua havia quatro décadas, quando sorrateiramente emboscou e ceifou a vida do “General dos Homens Livres da Nicarágua”, o camponês Augusto César Sandino, assassinado em 1934. Não queremos neste trabalho heroicizar essas lutas, especificamente, a Nicaraguense, temos consciência que houveram falhas após a tomada do poder, resultado claro do conjunto de contradições e próprias do espaço de experiência que qualquer país passa quando escolhe como alternativa a via do processo revolucionário. Exploraremos essas contradições mais detidamente na fase final do presente texto.

Dos movimentos guerrilheiros que eclodiram deste lado do globo nos anos posteriores a 1959, somente o proposto pela FSLN, da Nicarágua, ascendeu ao poder.

A repercussão desses acontecimentos causou, indubitavelmente, bastante frenesi para além de suas fronteiras. A vitória nicaraguense em 1979 energizou uma série de revoluções nas décadas de 1980, particularmente em El Salvador, e tornou a América Central palco das lutas rivalizadas entre revolucionários e “contras” revolucionários.

Achamos relevante, antes de mais, definir na concepção dos insurgentes qual a importância do pensamento de Sandino e como os nicaraguenses se apropriaram dele. Segundo um dos entrevistados, inquerido sobre o que é sandinismo, prontamente responde: “o sandinismo é nossa ideologia própria. É a aplicação de toda a bagagem política universal à nossa própria realidade particular” (INVERZINI,1985, pág.15). Teriam, deste modo, como exemplo ou modelo a revolução promovida em outro país. Enfaticamente reponde:

Se vocês me perguntassem se quero que a revolução nicaraguense seja como a soviética, respondo-lhes que não. Como a de Cuba, do Vietnã, da Tchecoslováquia? Tampouco. A Nicarágua não é nenhum desses países, nosso povo não é nenhum desses povos; e, precisamente por esse motivo, nenhuma outra revolução pode ser similar à nossa. Em suma, não nos identificamos como nenhum “modelo”. Portanto, deixemos de lado as definições, que implicam muitas conotações e impedem o aprofundamento das questões ideológicas. (INVERZINI,1985, pág.16).

Questionado sobre a influência da leitura de obras como as de Marx e Lênin, Arce busca deixar claro que em Nicarágua não se tem necessidade de tomar ideologias emprestadas. Foi o estudo de Sandino que os ofertaram uma boa quantidade de concepções políticas e teóricas. A esse respeito, cita durante a conversa a obra “Ideário de Sandino”, reordenada por outro grande militante revolucionário, que apesar de não ter visto a vitória da revolução, teve significativa contribuição para que ela fosse realizável. Trata-se de Carlos Fonseca, fundador e primeiro secretário da FSLN. Na obra mencionada, se pressagiava: “Muito breve alcançaremos o nosso triunfo definitivo na Nicarágua; e isso acenderá o pavio da explosão proletária contra os imperialistas de todo o mundo” (INVERZINI, 1985, pág.17). O sandinismo, portanto, diz respeito à ideologia que uniu povo em torno da luta por sua libertação.

Em diversos momentos das entrevistas, os comandantes dizem que como tática adotaram uma postura de flexibilidade e a partir dela geraram alianças importantes com outras forças para além dos camponeses e operários. Esses acordos, na concepção da Direção Nacional, seria o grande trunfo de sua revolução e garantiriam a manutenção do poder. A flexibilidade parece dizer respeito, sobretudo, ao que definiram enquanto economia mista, “fazer o que pode fazer”, onde a estratégia é concatenar-se a setores da classe média para angariar os lucros advindos da produção destes. Humberto Ortega declara: “Aqui se trata de fazer o que se pode fazer. E o que se pode fazer é exatamente o que estamos fazendo. Não podemos golpear, em nome de critérios ortodoxos, aqueles setores médios produtivos que representam uma preciosa força para o país” (INVERNIZZI, 1985, pág. 20).

O problema parecia ser a burguesia que pensava em dólares, mas não a que pensa em córdobas. Na leitura dos membros da Direção Nacional, mesmo fazendo isso, conservaram o princípio da revolução: unidade nacional, pluralismo, economia mista, de modo que nunca estivera no horizonte de expectativa desenvolver um projeto antiburguês, mas antes um projeto nacional- popular e fundamentalmente anti-imperialista. Não sabemos se isto fora um erro de avaliação e hoje estamos numa posição muito confortável para assim fazer, mas o que podemos dizer é que nas eleições de 1990, Daniel Ortega, candidato da Frente sandinista perde as eleições para setores desta mesma classe média antes aliadas, representadas pela figura de Violeta Chamorro, viúva do jornalista e proprietário do jornal “La Prensa”, morto pelas tropas somozistas.

Já que nos referimos a Direção Nacional, seria de bom grado mostrar a visão dos entrevistados sobre como o comitê coletivo conseguiu formar a si mesmo. Entre as três tendências, a saber, a revolucionaria (TP), a insurrecional (TI) e a de guerra popular prolongada (GPP), existiam diferenças concernentes aos métodos para que se alcançasse as rédeas do poder e sobre um nome que substituísse o secretário fundador da FSLN, homem que detinha a capacidade de agradar ambas as partes. Mas, apesar desses desacordos, havia unanimidade referentes aos objetivos políticos. No que tocava a temas crucias, as tendências se dissolviam. Usaremos mais uma vez as palavras de um dos entrevistados, desta vez a de Wheelock:

Com efeito, até 1976, tivemos um secretário geral, Carlos Fonseca. Mas, como Carlos morreu, nós nos dividimos, e seu substituto não terminou por ser reconhecido pelas outras tendências. Quando, finalmente, nos reunificamos, decidimos que na falta de um líder reconhecido por todos, tínhamos que de formalizar uma direção coletiva, composta por três representantes de cada uma das três tendências (INVERNIZZI, 1985, pág. 30).

Quando os guerrilheiros entraram marchando em Manágua, no dia 19 de julho, foram recebidos entusiasmadamente por grande parcela da população. A nova junta, composta por cinco membros e o Diretório nacional, levada ao poder não por meio das eleições, mas por uma insurreição popular, tinha legitimidade maior do que qualquer outro governo na América Central. A historiadora Matilde Zimmermann, estudiosa do tema, nos mostra que, para enfrentar a crise econômica, o governo nacionalizou todos os bancos nicaraguenses e assumiu o controle das exportações dos produtos mais importantes do país, entre eles: o algodão, o café e o açúcar. Foram baixados decretos contra a estocagem de provisões e a busca desenfreada do lucro, para impedir os comerciantes de elevar os preços e se aproveitar da situação desoladora de escassez generalizada. Foram empreendidas campanhas para que se conseguisse apoio internacional.

Contudo, passado o calor dos acontecimentos, era ainda preciso organizar as eleições do país. Segundo o ponto de vista dos comandantes, chamar as eleições de 1984 foi um modo de dar uma resposta às acusações apresentadas pelos norte-americanos para justificar sua agressão. Desta vez é Arce que responde:

Eles falavam de nossas relações com os países comunistas, do desenvolvimento de nossa capacidade defensiva, do suposto uso da Nicarágua como plataforma de desestabilização da América Central e, finalmente, de falta da democracia interna. O único elemento que deixava espaço para a política norte-americana era o das eleições. Por isso, decidimos realizá-las em novembro de 1984. (INVERNIZZI, 1985, pág. 62-63).

Inquerido sobre a formação de uma oposição que teria a capacidade de fazer frente ao partido Sandinista, Arce respondeu que sob o ponto de vista jurídico, haveria essa possibilidade. Mas os problemas deles, dos setores oposicionistas, é que jamais se preocuparam em desenvolver um verdadeiro projeto político capaz de representar uma alternativa à Frente Sandinista, e acabavam convertendo-se em simples agentes da política norte-americana.

A organização dos empresários e partidos da burguesia não somozistas manifestou, também, publicamente suas críticas a “falta de democracia” do governo e a “violação dos direitos humanos”, encaminhando suas reivindicações por intermédio do Conselho Superior de Empresas Privadas (Cosep), uma entidade que congregava as maiores empresas e era capitaneada por Alfonso Rabelo, dissidente da Frente Sandinista, e possível candidato do partido de oposição, o Movimento Nova Nicarágua (MDN). Outra inquietação que surge é por que as eleições não foram chamadas logo após a vitória da revolução. Sobre o assunto, Arce tem o seguinte posicionamento:

Se não o fizemos, não foi porque pensássemos que não havia necessidade de uma legitimidade eleitoral. Teríamos vencido com 99 % dos votos, e isso nos teria permitido evitar todas as especulações dos norte-americanos. Analisamos essa possibilidade, mas nos demos conta de que existiam exigências bem mais urgentes para o povo, que naquele momento não pensava certamente em eleições, mas no trabalho, na comida, na assistência médica, em todas essas coisas que nos faltavam (INVERNIZZI, 1985, pág. 59).

Nesse sentido, as eleições foram realizadas, uma vez que são uma forma para rearfimar a legitimidade de fato que a revolução conquistou. Por outro lado, interessava também a opinião do povo que, com o voto, podia se pronunciar sobre o programa do poder a pouco instalado. Após o processo eleitoral, no entanto, a guerra se intensificou. Bayardo Arce explicou isso através, mais uma vez, das agressões ianques. No momento em que as eleições retiravam o último pretexto para uma intervenção, não restou ao governo norte americano, agora sob o comando de Ronald Reagan, outra alternativa além de dar um novo impulso a guerra.

Outra questão problemática diante do mundo foi a contínua militarização dos exércitos nacionais sandinistas, inclusive valendo-se do recrutamento militar obrigatório. Se a FSLN empunhou armas há vintes anos para combater a ditadura de Somoza, cinco anos depois da vitória, o país permanecia cercado por ainda mais fuzis do que antes. O mundo queria saber como romper esse ciclo. No entendimento da Direção Nacional, enquanto nos Estados Unidos houver governos como o de Reagan, a Nicarágua deveria se manter armada. Não para conquistar o poder, como no passado, mas para defendê-lo. E por quê? Porque os políticos norte-americanos anunciaram publicamente seu desejo de destruir a revolução.

Infelizmente, segundo Ortega, o governo revolucionário estava sendo obrigado a investir enormes recursos na defesa. No dia em que os Estados Unidos aceitassem a revolução Nicaraguense, e que se abrisse um terreno para coexistência, os esforços do governo poderiam ser dedicados a outros objetivos. Surge uma nova questão, importante segundo nossa avaliação: os insurgentes estariam defendendo o poder ou um modelo de sociedade. Ortega esclarece:

Defendemos uma causa, princípios. Se renunciássemos a fazê-lo, tão somente porque os Estados Unidos ameaçam nos invadir, seríamos traidores. Defendemos o direito de construir uma sociedade nova e pluralista, onde os pobres sejam menos pobres, com uma posição internacional não- alinhada e capaz de enfrentar as injustiças onde elas se manifestem (INVERZINNI, 1985, pág. 83).

Com a desaceleração dos conflitos militares em 1987, muitos trabalhadores e campesinos que em nome da autonomia interromperam suas atividades durante a guerra, esperavam voltar ao centro das atenções. Se, como dizia Jaime Wheelock, no interior do processo revolucionário, criou-se espaços para a existência e o funcionamento de economia privada, a diferença consistia no fato de que o poder não é de essência burguesa, mas popular, e, com efeito, como afirmou certa feita, Bayardo Arce, a FSLN considerava os grandes proprietários de terras do país e representa-os em termos da nação,, mas em termos da luta de classes e da luta popular, não podemos representá-las porque tinham tomado a decisão de basear-se na aliança entre trabalhadores e campesinos, havia, entretanto, uma contradição impossível por trás de ambas preposições.

Partilhamos do pensamento proposto por Zimmermann, quando a autora nos informa que governo sandinista nem poderia defender os interesses do capital privado nem continuar construindo a aliança entre trabalhadores e campesinato, baseada na reforma agrária, na proteção dos direitos dos mais pobres e na mobilização das classes trabalhadores. A estudiosa nos mostra que por volta do final de 1987, o Diretório Nacional havia decidido afastar-se da orientação anticapitalista e pró-socialista dos primeiros anos da revolução e, em lugar dele, confiar nos mecanismos de mercado e em incentivos ao lucro para tentar reaquecer a economia. Na tentativa de justificar esse processo de conciliação e subordinação aos ditames do mercado, o ministro responsável pela reforma agrária pontua:

Somente depois do triunfo é que no dedicamos a estudar como as circunstâncias históricas do país poderiam garantir aqueles dois princípios, estabilidade e produção. Não queríamos aplicar nenhum esquema, mas somente compreender que condições políticas poderiam nos garantir a realização de uma boa reforma. A unidade nacional e o pluralismo eram dois princípios que deveriam ser respeitados. Mas tínhamos que levar em conta elementos objetivos como a escassez de recursos do país e o atraso do mundo camponês. Essa série de considerações condicionou a primeira fase da reforma agrária, que foi a expropriação das terras de Somoza. Mas, como já disse, tratava-se de terras que não permitiam realizar uma reforma de tipo popular, capaz de satisfazer as aspirações dos camponeses pobres sem terra. (Grifos nossos). (INVERNIZZI, 1985, págs. 137-138).

Na interpretação de Wheelock essas propriedades eram muito grandes, plantações modernas que produziam essencialmente para exportação, logo não podiam ser entregues aos camponeses. Por isso, optou-se por transformá-las em empresas estatais. A ideia central era estabilizar a produção, fazer com que essas empresas se tornassem mais ativa do que o setor privado. Mas enquanto isso, quase de imediato, perceberam os limites da reforma agrária. Como já atentamos anteriormente, para respeitar também os princípios de unidade nacional e pluralismo, economia mista, o governo decidiu não tocar nos produtores privados eficientes.

Assim sendo, nos idos de 1987, a distribuição de terras declinou acentuadamente e, em 1988, tornou-se quase inexistente na prática. Ainda havia dezenas de milhares de famílias rurais esperando seus lotes. Zimmermann chega a constatação que essa mudança de postura da FSLN representou o começo do fim da revolução na Nicarágua.

Impõe-se a seguinte, última e, talvez, a mais difícil questão a se responder: Por que as mesmas pessoas que lideraram uma genuína revolução social em 1979 e defenderam o poder dos trabalhadores e campesinos, decidiram, no final dos anos 80, que o único modelo possível em maior ou menor grau era o desenvolvimento via capitalismo?

Nos valendo pela derradeira vez do trabalho de Zimmermann, alguns nicaraguenses e pensadores explicam a atitude como um caso de corrupção pessoal. Obviamente, o padrão de vida dos comandantes da revolução aumentou em comparação com os anos anteriores ao processo revolucionário. Ao que parece, mesmo assim, esse ainda é um aspecto secundário. Outros atribuem ao colapso da União soviética uma expressão clara que a revolução socialista não era mais um caminho possível. Não se pode deixar de considerar os altos custos da guerra frente aos “contras”. Deve ter sido um fator que persuadiu os membros da Direção Nacional a procurar novas maneiras para que se evitasse antagonizar diretamente com o governo estadunidense.

Por último, alguns pontos da política que ficou designada como “acordo” pareceu sempre estar no horizonte de expectativa de pelo menos uma das tendências mesmo antes da revolução, a da Tendência Insurrecional, os chamados terceiristas, em seu compromisso com a economia mista. Queríamos lançar mão de um trecho do livro a Revolução Nicaraguense, de Matilde Zimmermann:

Apesar de as classes populares de Nicarágua terem exibido seu poder e determinação tanto na insurreição quanto no combate aos contras, a liderança nacional da FSLN tinha cada vez menos confiança na capacidade de trabalhadores e campesinos para transformar a sociedade(ZIMMERMANN, 2006, pág. 148).

Cada vez mais, tudo levava a crer que a Direção Nacional os considerava objetos e não sujeitos atuantes da história e totais donos de seus próprios destinos, sendo um grupo atrasado demais para aceitar as ideias “iluminadas” da vanguarda. Trabalhadores e camponeses nicaraguenses que nunca se renderam, derrotaram a ditadura somozistas e a guerra dos contras, financiada pelos Estados Unidos. Lutaram durante uma década contra as tentativas da burguesia nicaraguense de manter um sistema econômico baseado na exploração e em privilégios. Dificilmente poderiam lutar com o mesmo ímpeto contra a Direção Nacional, órgão máximo de sua revolução. No final, apesar de reconhecer a importância e o significado histórico daqueles homens esfarrapados que provocaram festa nas ruas nicaraguenses, quem acabou se rendendo não foi a mãe de ninguém, mas sim as mães de todos. Se rendia, na verdade, o projeto de superação do capital na América central e Caribe via socialismo.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

INVERNIZZI, Gabriele (org.). Sandinistas; tradução de Carlos Nelson Coutinho. São Paulo; Brasiliense, 1985, 149 pp.

LENIN, VladimirIlitch. Que fazer? Disponível em <https://pcb.org.br/portal/docs/quefazer.pdf>. Acessado em 30 de março de 2018.

MAREGA, Marisa. A Nicarágua Sandinista. São Paulo; Brasiliense, 1981, 75 pp.

ZIMMERMANN, Matilde. A revolução de 1979. Epílogo. In Carlos Fonseca e a revolução nicaraguense. São Paulo: Expressão popular, 2012, pp. 321/354.

ZIMMERMANN, Matilde. A Revolução Nicaraguense; tradução de Maria Silvia Mourão Netto. São Paulo: Editora UNESP, 2006, 157 pp.

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* Lucas Tadeu Borges Viana é Graduando do curso de história da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e bolsista do programa de Educação Tutorial da mesma instituição (PET).





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